Prof. Wilson Horvath
Na Sexta-Feira da Paixão,
recebi a triste notícia que um aluno havia falecido, ele perdeu a luta contra
as drogas e o crack fez mais uma vítima! O menino era bom, educado, atencioso;
após as aulas, quase sempre vinha falar comigo, tecia um comentário sobre o
conteúdo ou apresentava um questionamento. Nessas conversas, falava das
dificuldades em se libertar do vício e também apresentava belos sonhos para o
futuro...
Sua morte me trouxe uma enorme
tristeza, primeiro perdi uma pessoa querida. E como educador fui impotente
diante daquela situação, não consegui fazer uma intervenção adequada que
pudesse colaborar no redimensionamento de sua vida.
O vício e o consumo excessivo
de drogas, sejam elas lícitas, sejam ilícitas, sejam as adquiridas na
“biqueira”, sejam os psicotrópicos comprados com receituário na farmácia, é uma
das manifestações do vazio existencial vivenciado por nós na contemporaneidade.
O ser humano é expropriado de
sua humanidade, e somos coisificados, tornamos “coisa”, uma peça barata dentro
do sistema de produção, que pode ser substituída, jogada fora a qualquer
momento.
Nossa vida praticamente se
resume ao trabalho, não somos mais gente! Somos humanoides cada vez mais
parecidos com máquinas, vivemos para produzir; trabalhamos sem cessar, até
nossas últimas forças, tenebrosos de sermos descartados na massa desempregada,
o exército de reserva.
Essa relação de “coisas”
ultrapassa os limites do mundo do trabalho e chega às relações pessoais,
fazendo com que os antigos laços familiares, amorosos, de amizade, de solidariedade
se apaguem. A outra pessoa, o próximo só é bom, enquanto dele se pode tirar
algum proveito. E não servindo mais... o troca, o esquece, o elimina.
Para anestesiar nossa mente
diante dessa realidade sombria nos é ofertado o consumo, o “Ser deu lugar ao Ter”.
Não somos mais o que somos, tornamos o que consumimos. E por isso o fazemos de
forma frenética e alucinatória, compramos sem precisar, muitas vezes sem nem
saber para que serve; comemos compulsivamente; assistimos séries ou filmes um
atrás do outro.
Nos isolamos do mundo diante
da tela do computador ou celular, esses se tornam obsoletos quase
instantaneamente após a compra, precisando ser substituídos por modelos mais
novos, que desconhecemos a priori
quais são suas atualizações.
As consequências são visíveis,
por exemplo, no aumento do número de suicídios, cerca de 30% na última década,
juntamente com o crescimento de quadros depressivos, de automutilação, em
especial entre crianças e jovens, os que mais sofrem. E não podemos esquecer do
consumo de drogas que abrevia a vida de tantos, como fez com meu aluno.
Esse cenário tão cruel e
irracional clama por saídas. E muitas das soluções encontradas, não questionam
a raiz do problema, apenas suas manifestações. E vão contra aqueles que sofrem,
outras vítimas do sistema, e não contra quem o manipula.
Elas reacendem no sujeito,
constantemente massacrado pelo sistema, aquilo que há de pior no ser humano, os
monstros mais perversos.
É sempre bom lembrar a frase
atribuída a Bertolt Brecht: “A cadela do fascismo está sempre no cio”. E em
épocas como a que estamos vivendo, o ideário fascista ganha forças, se liberta
da barreira do Superego, se materializa em alguns personagens asquerosos e
caricatos. E no Brasil o ódio se canaliza contra àqueles que sempre sofreram: o
pobre, o negro, o índio, a mulher.
Para salvar e manter esse
desumano sistema em funcionamento, os poucos direitos que a classe trabalhadora
conquistou ao longo de anos de luta são ameaçados, retirados por políticos
inescrupulosos, vassalos ou membros da mesma elite que sempre mandou e usurpou
o país.
Esse cenário é desanimador,
nos amedronta, não sabemos como e por onde construir novos caminhos. Tal como
ocorreu com os discípulos de Jesus após a sua crucificação ou nas dificuldades encontradas na travessia do deserto, que fez alguns hebreus terem saudades das cebolas do Egito (Nm 11, 5).
Mas a história não acaba no sofrimento, depois da escravidão vem a liberdade, da morte renasce a vida, a esperança permanece sempre.
Mas a história não acaba no sofrimento, depois da escravidão vem a liberdade, da morte renasce a vida, a esperança permanece sempre.
A palavra “Páscoa” quer dizer:
“passagem”. Ela é celebrada por judeus e cristãos. No judaísmo se celebra a
“passagem” da escravidão no Egito para a liberdade na Terra Santa. E os
cristãos celebram a “passagem” da morte de Cristo para a vida ressuscitada.
A reflexão sobre a
ressurreição serve a todos aqueles que aspiram a um mundo melhor. Ela pode ser
lida e analisada não só por cristãos, mas também se abre para pessoas de outras
religiões, inclusive aos ateus.
Ela reacende e renova a
esperança. Ela abre a possibilidade para apostarmos, para lutarmos, pois, o fim
não está na morte, mas na vida, como nos diz Hölderlin: “onde cresce o perigo,
cresce também o que salva”.
A ressurreição pode ajudar a
abrir nossos olhos para as correntes que nascem constantemente contra o
sistema, que buscam de alguma forma um mundo mais humano e fraterno, tais como:
movimentos feministas, indígenas, ecológicos, homoafetivos, étnicos, políticos,
religiosos, economias solidárias, mídias alternativas.
Houve a ressurreição, a
passagem da escravidão para a liberdade, a páscoa da morte para a vida!
Celebrar a Páscoa é ressuscitar
a esperança, presente em cada um e uma de nós!
Por isso, não desanimemos, ao
contrário: Caminhemos... lutemos... construamos a passagem para uma vida mais
digna!
Feliz Páscoa!
Nenhum comentário:
Postar um comentário