Este texto trabalha a
definição de Mito usada nas ciências humanas como forma de conhecimento, talvez
a mais antiga presente na humanidade.
Prof. Wilson Horvath
A palavra “Mito” é polissêmica,
assim ela tem vários significados e pode ser usada de diferentes maneiras. Ela
pode significar mentira, por exemplo: “Leite com manga não mata, isso é um
mito”. Pode se referir a alguma grande personalidade, neste caso: “Ayrton Senna
é um mito nacional”.
No entanto, dentro da filosofia,
antropologia e ciências afins, entendemos o Mito como uma maneira de explicar
a realidade, uma forma de conhecimento específica que recorre a elementos
simbólicos, a arquétipos. E sempre em sua narrativa estarão presentes elementos
sobrenaturais.
O mito é a forma de
conhecimento mais antiga que há; talvez já presente na cultura de nos
nossos passados hominídeos desde o aparecimento da linguagem, em que os deuses,
espíritos determinavam normas de conduta, formas de alimentação, remédios, etc.
O mito explica a realidade sem
utilizar nem a ciência, nem a razão, essas duas são outras formas de
conhecimento da realidade, mas isso não quer dizer que esta forma de
conhecimento seja mentirosa; ao contrário, o mito é uma verdade!, mas
uma verdade mitológica, que não depende de provas racionais e empíricas.
Assim, pensemos em uma planta
que pode curar determinada doença; os cientistas estudam e apresentam os
princípios ativos presentes nela; enquanto o mito apresentará essa planta
como um presente dos deuses.
Observe: são duas
formas de conhecimento diferentes, mas ambas chegam a resultados muito
parecidos. É claro que o pensamento mitológico pode estar errado, mas a ciência
também pode.
Vejamos outro exemplo, eu
posso não mentir ou não matar alguém, pois por meio do uso a razão controlo meus
instintos; e tendo como premissa a dignidade humana, conforme raciocinou Kant[1], ou posso fazer o mesmo (dizer
a verdade e não assassinar) pois um deus assim mandou. Novamente, temos que conclusões
parecidas entre duas formas de conhecimento distintas.
A principal diferença do
pensamento mitológico das outras formas de conhecimento é que ele independe
de provas empíricas, ninguém precisa ver um deus ou um espírito para ter
certeza de suas vontades. A outra é que o mito não se preocupa com a
contradição, assim ele pode dizer algo em um momento e em outro algo diferente,
até oposto.
O mito sempre traz um
ensinamento (conduta, prescrições, interdições) de uma instância sobrenatural
(Céu, Monte Olímpio, Mundo dos Mortos, etc.) e essas verdades são inquestionáveis,
eternas. Ele sempre trará uma explicação definitiva acerca de algo
seja o ser humano, seja um fenômeno natural.
Mesmo que outra pessoa possa apresente
outra versão do mito, ela não estará questionando a primeira narrativa, mas
apresentando de outra forma a mensagem do mundo sobrenatural. Lembre-se: o
mito não se preocupa com a contradição.
E quem narra o mito é alguém
escolhido pelos deuses ou pelos espíritos, não é qualquer pessoa, apenas
aqueles que podem se comunicar com o mundo sobrenatural e apresentar suas
verdades ao demais, como os sacerdotes ou médiuns.
Na Grécia Antiga era mito era narrado
pelo Poeta-Rapsodo (ραψῳδός), artista popular ou cantor que, ia de
cidade em cidade, recitando poemas, principalmente as epopeias, tais
como a Ilíada e a Odisseia, em que apresentavam histórias de deuses e heróis.
[1] “Segundo o conceito do
dever necessário para consigo mesmo, o homem que anda pensando em se suicidar
indagará a si mesmo se a sua ação pode estar de acordo com a idéia da
humanidade como fim em si mesma. Se, para fugir a uma situação penosa, se
destrói a si mesmo, serve-se ele de uma pessoa como de um simples meio para
conservar até ao fim da vida uma situação tolerável. Mas o homem não é uma
coisa; não é, portanto, um objeto passível de ser utilizado como simples meio,
mas, pelo contrário, deve ser considerado sempre em todas as suas ações como
fim em si mesmo. Não posso, pois, dispor do homem em minha pessoa para o
mutilar, degradar ou matar” (KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos
costumes e outros escritos, tradução de Leopoldo Holzbach, São Paulo:
Martin Claret, 2004, p. 59).
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