Prof. Wilson Horvath
A
experiência mística dos primeiros fiéis com Nossa Senhora Aparecida vai contra as
formas de opressão social; responde desde sua aparição a questionamentos
humanos existenciais e sociais. E possibilita ao povo lutar por uma vida mais digna e
fraterna.
O
Brasil é um dos países mais racistas e preconceituosos do mundo, se não for o
mais, haja vista que os negros e indígenas são as etnias que mais sofrem assassinatos, em que há maior número de pessoas desempregadas ou em empregos precários, nelas
ocorrem mais estupro de mulheres, etc.
Nós
fomos o último país do ocidente a abolir a escravidão, somente em 1888, mais de
dois terços da história do Brasil Moderno foi escravagista. E nesse contexto de
escravidão e sofrimento, três pescadores encontram a imagem da Santa Negra, Mãe e Rainha das Águas Doces, no
Rio Paraíba. E em seguida aconteceram, dentre outros, dois milagres (pesca e libertação) muito significativos, que nos trazem pistas teológicas que hoje ou
estão esquecidas ou camufladas por práticas religiosas conservadoras e
reacionárias.
Esses
milagres respondem ou, ao menos, dialogam com a famosa fala de Marx, presente
na Introdução à “Crítica da Filosofia do Direito de Hegel” que se tornou
chavão nas ciências sociais: “A religião é o ópio do povo".
Essa
máxima marxista é verdadeira se olharmos a partir de dois focos: Primeiro, ao longo da história da humanidade, a
religião foi usada pela elite dominante
como mecanismo de dominação e controle social. Segundo, a reflexão religiosa
pode alienar, tirar do ser humano o entendimento e as preocupações de sua realidade concreta, fazendo-o
refletir e aspirar um mundo metafísico imaginário.
No
entanto, se olharmos de perto para a experiência de Aparecida, bem como a maioria das experiências religiosas em sua gênese, veremos o contrário, ou seja, elas
nascem respondendo aos problemas concretos, do dia a dia, não metafísicos. E elas surgem para
libertar e não oprimir.
E todas
as experiencias religiosas significativas brotam ou dos pobres, daqueles que
sofrem, como no caso de Aparecida, ou por aqueles que se identificaram com os
pobres, tais como: São Francisco de Assis e Sidarta Gautama (Buda). Mesmo que posteriormente elas sejam cooptadas, controladas por aqueles que
dominam; o seu nascimento nunca se deu “nos palácios”, mas sempre nas “manjedouras”,
em meio aos escravos sejam do Egito sejam os das senzalas brasileiras.
Os
milagres iniciais de Aparecida, assim, são manifestações do sagrado, do divino
que vão nessa direção de emancipação, de transformação social e combate às
injustiças, vejamos:
O
primeiro deles diz respeito à alimentação, condição básica de sobrevivência, em
que se manifestou na grande quantidade de peixes na pesca. Nossa Senhora de Aparecida quer
que seus filhos estejam alimentados, que não sejam privados de meios de subsistência. A religião concreta atende tanto às necessidades materiais como às espirituais.
O
outro milagre, que destaco, foi a quebra, o rompimento das correntes do escravo
Zacarias. A Virgem Negra é contra a escravidão, lhe desagrada o fato de um ser
humano dominar o outro. Ela como negra, sentiu o sofrimento de seu povo e os
libertou das amarras sociais e escravocratas.
E
essa experiência mística que os escravos, libertos pobres e devotos em geral
fizeram em Aparecida deram forças para lutar contra a escravidão e outras
formas de opressão.
O
seu rosto negro é até hoje sinal de confronto, de antítese ao preconceito. Por
mais racista que a pessoa seja, ela tem que se deparar com a Virgem Negra, isso
necessariamente a faz questionar, mesmo que seja a nível do inconsciente. É uma
questão de representação social.
E
a Santa de Aparecida, Mãe de Amor, está nos corações das pessoas do povo, de uma forma impressionante,
que como dizia Pascal: “minha vã filosofia é incapaz de explicar”. Ela é apoio,
mãe generosa de forças para todos os que sofrem e caminham rumo a uma vida
melhor tanto social como pessoal.
Viva
Nossa Senhora Aparecida, Viva a Santa Negra.
E
abaixo todo o preconceito e forma de opressão!
Professor ao ler este texto, lembro da sua voz como se estivesse nos contando a história. Com seu jeito único de boa trazer a realidade, e nos mostrar o que está oculto dentro da nossa história...
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